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Médico Veterinário Tharley Carvalho
Gerente de Produtos da Ceva Saúde Animal
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O primeiro relato da "Doença de Gumboro" foi feito por Albert Cosgrove no início da década de 1960, com base em um caso clínico ocorrido em uma granja localizada na pequena cidade de Gumboro, no estado de Delaware nos EUA. É por esse motivo que muitas pessoas se referem ao Vírus da Doença Infecciosa da Bursa como "Doença de Gumboro"’.
A Doença de Gumboro ou Doença Infecciosa da Bursa (IBD) é uma enfermidade em aves causada por um Avibirnavírus denominado Vírus de Gumboro ou Vírus da Doença Infecciosa da Bursa (IBDV). Os sinais clínicos diferem, mas em todos os casos causam enormes danos.
O vírus de Gumboro ingressa nas aves pela via oral e em algumas horas é identificado nos macrófagos e nas células linfóides do trato digestivo, inclusive no ceco, duodeno, jejuno e fígado. Logo em seguida, ele entra na primeira fase de viremia que lhe permite chegar até o órgão-alvo, que é a bursa de Fabricius onde ocorre a replicação.
Essa replicação é responsável por diversas alterações morfológicas do órgão, que corresponde a
inúmeras lesões microscópicas e macroscópicas bastante variáveis.
Entre elas inclui-se a destruição maciça dos linfócitos B, o que explica a depleção dos folículos linfóides da bursa. Após a replicação na bursa, ocorre uma segunda viremia maciça.
A intensidade e a extensão das lesões explicam os efeitos clínicos da infecção. Embora isso não seja totalmente entendido, tais efeitos dependem de diversos fatores, inclusive:
- Do tipo de vírus de Gumboro que infecta as aves,
- Da virulência desse vírus,
- Do tipo genético das aves,
- De seu status de imunidade ativa e passiva,
- Da idade na data da infecção,
- De infecção concomitante com outros patógenos,
- De alguns fatores ambientais, como a época do ano, a qualidade da raçDão, as condições de bem-estar, etc.
O IBDV é um vírus tão resistente, que sobrevive mesmo após procedimentos de rotina bem feitos de limpeza e desinfecção. Na maioria das vezes, depois de contaminados, os galpões tendem a permanecer contaminados.
O agente causador já está presente na granja, na cama, ou antes de os pintos de um dia serem alojados nos galpões, de forma que a probabilidade de desafio na maioria das granjas é exatamente 100%.
Nessa situação especial, é compreensível que a
vacinação tenha como objetivo: tanto
proteger as aves como prevenir o desafio de sair do controle, ou seja, "controlar" a Doença de Gumboro.
Os objetivos do programa ideal de vacinação contra Gumboro devem ser:
Garantir a
proteção contínua das aves contra infecção pelo IBDV da Granja, desde o alojamento dos pintos de um dia até a saída para o abatedouro ou o galpão de postura ("proteção viral").
Se não for possível essa prevenção, as aves devem então ser no mínimo
protegidas contra os efeitos iniciais da infecção ("proteção clínica").
Prevenir ou reduzir significativamente a quantidade de
vírus excretado pós-desafio ("proteção contra excreção").
Prevenir o
aumento da pressão viral, ciclo após ciclo.
Prevenir a evolução do IBDV da Granja para um vírus capaz de sobreviver ao programa de proteção.
Esses dois últimos pontos são os resultados da "proteção contra a excreção". Em outras palavras, os objetivos do programa ideal de vacinação contra a IBD deveriam ter como meta PARAR COM O CICLO DE GUMBORO.
Apenas um programa de prevenção de Gumboro e de vacinação eficaz consegue parar o ciclo dessa doença e o aumento da pressão viral.
Atualmente as tecnologias mais utilizadas para imunização contra a doença de Gumboro são as vacinas vivas complexo-imune e as vacinas vetorizadas de Marek rHVT+ IBD, sendo que as vacinas complexo-imune se destacam, com elevado número de aves vacinadas, mais de 70% dos frangos produzidos no Brasil. Isso se deve, à capacidade dessa tecnologia de controlar a enfermidade de forma efetiva, o que foi experimentado pela indústria brasileira nas últimas década e meia.
VACINAS COMPLEXO IMUNE
Consistem em suspensão do vírus de Gumboro vivo atenuado do tipo Intermediário Plus misturado, em proporções bem definidas com antissoro. Dessa forma, o vírus vacinal é coberto por imunoglobulinas específicas (Imunoglobulinas Protetoras do Vírus, ou VPI) e, portanto, fica protegido de ser reconhecido pelos anticorpos maternais (AcM).
Após a administração, as VPI são catabolizadas ao mesmo tempo que os AcM; e o vírus vacinal é liberado. A proteção da vacina, que corresponde à replicação do vírus vacinal na Bursa,
ocorre quando os AcMs atingem um nível que permite a chegada do vírus vacinal na Bursa, antes do lote tornar-se suscetível à infecção.
A segurança das vacinas Complexo Imune é semelhante à das vacinas vivas do tipo Intermediárias, com a vantagem adicional que todas as aves são imunizadas com a mesma dose bem controlada da vacina.
Imunizações com este tipo de tecnologia, ciclo após ciclo,
diminuem a pressão viral, e consequentemente,
a pressão por seleção não ocorre na população viral da granja, e assim se alcança o
“controle” verdadeiro da doença.
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VACINA VETORIZADA (RHVT+IBD)
Estas vacinas são produzidas a partir de vírus geneticamente modificados (vetor HVT), cujo genoma contém o gene do vírus de Gumboro, que codifica a proteína VP2 do capsídeo viral.
Diferentemente das vacinas vivas, a vacina recombinante não estimula todos os ramos do sistema imune, pois não existe a replicação do vírus de Gumboro, mas apenas uma resposta de anticorpos contra o antígeno VP2, carregado pelo vírus de Marek (rHVT).
Ao contrário das vacinas Intermediárias Plus, em que a proteção completa aparece cerca de dois dias após a replicação do vírus, a proteção induzida pelas vacinas rHVT-VP2 vai aumentando aos poucos (depende da produção de anticorpos), levando alguns dias até várias semanas pós-administração.
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A vacina rHVT-VP2 não impede a replicação do vírus de campo nas aves. Por isso, a pressão nos aviários se mantém, ou até mesmo, aumenta. No curto prazo, a imunidade induzida pelas vacinas rHVT-VP2 é adequada contra vírus de campo homólogos, mas limitada no caso de desafio precoce, como ocorre em áreas onde a pressão viral é alta.
É comum ver lotes vacinados com vacinas rHVT-VP2 apresentarem sinais de infecção (lesões macroscópicas e microscópicas com identificação do vírus de campo por PCR nas bursas), ou se recomendar a complementação do programa de vacinação com vacina viva atenuada.
A longo prazo, o fato de a imunidade ser específica para o tipo de antígeno, e não proteger igualmente contra todas as cepas virais de Gumboro
afeta negativamente a prevenção da doença.
As vacinas rHVT-VP2 conferem baixa eficácia contra infecção e excreção, e essa proteção é até menor com algumas cepas, favorecendo o surgimento de novas variantes, o que pode ser evidenciado em vários trabalhos de campo, como exemplo um trabalho realizado recentemente em 2022 – Figura 2.
Em frangos de corte, a melhor opção é usar vacina de Gumboro viva atenuada do tipo Intermediária Plus. Somente essa categoria de vacina consegue conferir nível elevado de proteção contra diversos tipos de IBDV e prevenir a excreção de forma eficaz, de modo que a pressão viral diminui ciclo após
ciclo e se evita a probabilidade de surgimento de IBDV variante.
Como a vacinação no incubatório é o único método que garante 100% de cobertura vacinal, então a apresentação dessa vacina deve ser na forma Complexo-Imune.